Dom José Falcão faz uma reflexão sobre a desolação de Cristo. Cita os seguintes textos:
A palavra “desolação” vem do latim:
“desolatio” ou “desolationis”
Termo formado:
do prefixo “de”, que evoca a ideia de “separação”, “privação” e de “solus”, que significa “sozinho” ou “isolado”
Eis que vem a hora, e ela já veio, em que sereis espalhados, cada um para o seu lado, e me deixareis sozinho. Mas não estou só, porque o Pai está comigo.
João 16, 32
“Era desprezado, era a escória da humanidade, homem das dores, experimentado nos sofrimentos; como aqueles, diante dos quais se cobre o rosto, era amaldiçoado e não fazíamos caso dele. Em verdade, ele tomou sobre si nossas enfermidades, e carregou os nossos sofrimentos: e nós o reputávamos como um castigado, ferido por Deus e humilhado. Mas ele foi castigado por nossos crimes, e esmagado por nossas iniquidades; o castigo que nos salva pesou sobre ele; fomos curados graças às suas chagas. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, seguíamos cada qual nosso caminho; o Senhor fazia recair sobre ele o castigo das faltas de todos nós. Foi maltratado e resignou-se; não abriu a boca, como um cordeiro que se conduz ao matadouro, e uma ovelha muda nas mãos do tosquiador. Ele não abriu a boca”.
Isaías 53, 3-7
Retirou-se Jesus com eles para um lugar chamado Getsêmani e disse-lhes: “Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar”. E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes, então: “Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo”. Adiantou-se um pouco e, prostrando-se com a face por terra, assim rezou: “Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice! Todavia não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres”.
Mateus 26, 36-39
Foram em seguida para o lugar chamado Getsêmani, e Jesus disse a seus discípulos: “Sentai-vos aqui, enquanto vou orar”. Levou consigo Pedro, Tiago e João; e começou a ter pavor e a angustiar-se. Disse-lhes: “A minha alma está numa tristeza mortal; ficai aqui e vigiai”. Adiantando-se alguns passos, prostrou-se com a face por terra e orava que, se fosse possível, passasse dele aquela hora. “Aba!” (Pai!), suplicava ele. “Tudo te é possível; afasta de mim este cálice! Contudo, não se faça o que eu quero, senão o que tu queres”.
Marcos 14,32-36
Ao chegar àquele lugar, disse-lhes: “Orai para que não caiais em tentação”. Depois se afastou deles à distância de um tiro de pedra e, ajoelhando-se, orava: “Pai, se é de teu agrado, afasta de mim este cálice! Não se faça, todavia, a minha vontade, mas sim a tua”. Apareceu-lhe então um anjo do céu para confortá-lo. Ele entrou em agonia e orava ainda com mais instância, e seu suor tornou-se como gotas de sangue a escorrer pela terra.
Lucas 22, 40-44
Próximo da hora nona, Jesus exclamou em voz forte: “Eli, Eli, lammá sabactáni?” – o que quer dizer: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?
Mateus 27, 46
Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir plenamente a Escritura, disse: “Tenho sede”.
João 19, 28
“Este Salmo apresenta a figura de um inocente perseguido e circundado de adversários que desejam a sua morte; e ele recorre a Deus numa lamentação dolorosa que, na certeza da fé, se abre misteriosamente ao louvor. Na sua oração, a realidade angustiante do presente e a memória consoladora do passado alternam-se, numa difícil tomada de consciência acerca da sua situação desesperada que, no entanto, não quer renunciar à esperança. O seu clamor inicial é um apelo dirigido a um Deus que parece distante, que não responde e parece tê-lo abandonado: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes? As palavras do meu clamor não são por Vós ouvidas. Meu Deus, clamo de dia e não me respondeis; imploro durante a noite, sem conseguir sossegar” (vv. 2-3). Deus cala-se, e este silêncio dilacera a alma do orante, que chama incessantemente, mas sem encontrar uma resposta. Os dias e as noites sucedem-se, numa busca incansável de uma palavra, de uma ajuda que não chega; Deus parece tão distante, tão esquecido, tão ausente! A oração pede escuta e resposta, solicita um contato, procura uma relação que possa conferir conforto e salvação. Mas se Deus não responde, o grito de ajuda perde-se no vazio e a solidão torna-se insustentável. E, no entanto, o orante do nosso Salmo, no seu brado, chama três vezes o Senhor “meu” Deus, num extremo gesto de confiança e de fé. Não obstante qualquer aparência, o Salmista não pode acreditar que o vínculo com o Senhor se tenha interrompido totalmente; e, enquanto pergunta o porquê do presumível abandono incompreensível, afirma que o “seu” Deus não o pode abandonar. Como se sabe, o clamor inicial do Salmo, “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?”, é citado pelos Evangelhos de Mateus e de Marcos como o grito lançado por Jesus agonizante na Cruz (cf. Mt 27,46; Mc 15,34). Ele manifesta toda a desolação do Messias, Filho de Deus, que enfrenta o drama da morte, uma realidade totalmente oposta ao Senhor da vida. Abandonado por quase todos os seus, atraiçoado e renegado pelos discípulos, circundado por quantos o insultam, Jesus encontra-se sob o peso esmagador de uma missão que deve passar pela humilhação e o aniquilamento. Por isso, clama ao Pai, e o seu sofrimento assume as palavras dolorosas do Salmo. Mas o seu grito não é desesperado, como 0 do Salmista, que na sua súplica percorre um caminho atormentado…
Eis então, imperioso, novamente o pedido de socorro: “Mas Vós, Senhor, não vos afasteis de mim; sois o meu auxílio, apressai-vos a ajudar-me […] Salvai-me!” (vv. 20.22a). Trata-se de um grito que descerra os céus, porque proclama uma fé, uma certeza que vai mais além de toda a dúvida, de toda a escuridão e de toda a desolação. E a lamentação transforma-se, deixando espaço ao louvor no acolhimento da salvação: “Vós respondestes-me. Então, anunciarei o vosso Nome aos meus irmãos, e louvar-vos-ei no meio da assembleia” (vv. 22c-23). Assim, o Salmo abre-se à ação de graças, ao grande hino final que abrange todo o povo, os fiéis do Senhor, a assembleia litúrgica e as gerações vindouras (cf. vv. 24-32). O Senhor acorreu em ajuda, salvou o pobre e mostrou o seu rosto de misericórdia. Morte e vida cruzaram-se num mistério inseparável, e a vida triunfou; o Deus da salvação manifestou-se como Senhor incontestado, que todos os confins da terra celebrarão e diante do qual todas as famílias dos povos se prostrarão. É a vitória da fé, que pode transformar a morte em dom da vida, o abismo da dor em fonte de esperança.
Caríssimos irmãos e irmãs, este Salmo levou-nos ao Gólgota, aos pés da Cruz de Jesus, para reviver a sua paixão e compartilhar a alegria fecunda da Ressurreição. Portanto, deixemo-nos invadir pela luz do mistério pascal, mesmo na aparente ausência de Deus, também no silêncio de Deus e, como os discípulos de Emaús, aprendamos a discernir a verdadeira realidade, para além das aparências, reconhecendo o caminho da exaltação precisamente na humilhação, e a plena manifestação da vida na morte, na cruz. Assim, depositando toda a nossa confiança e a nossa esperança em Deus Pai, em cada angústia também nós O poderemos suplicar com fé, e o nosso grito de ajuda transformar-se-á em cântico de louvor”.
Papa Bento XVI
Audiência geral, 14/09/2011
Ecclesia:
O Ecclesia é um programa de catequese que aborda temas relacionados a doutrina e a fé da Igreja Católica.
A partir da história da Igreja, procura-se desvendar os mistérios da fé, dialogando sobre a doutrina, vida dos santos, dogmas, devoções e as principais festas do calendário litúrgico.
É um programa para todo católico aprender e aprofundar seus conhecimentos no mistério divino, a fim de viver de fato a Igreja católica.
Programa inédito: terça, 19h30.
Reprise: domingo, 9h30 e 19h.