Dom José Falcão de Barros reflete sobre a frase “Seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu”, da oração do Pai Nosso, a partir de um texto de Santo Ambrósio:

“Por que na oração dominical dizemos ‘o pão nosso’? Antes, disse ‘pão’ (ἐπιούσιον), isto é, substancial. Este não é o pão que entra no corpo, mas é aquele pão de vida eterna, que sustenta o íntimo da nossa alma. Por isso, em grego se diz ἐπιούσιος. Os latinos, ao invés, chamaram esse pão ‘de cada dia’, porque os gregos chamam τὴν ἐπιούσαν ἡμέραν, do dia seguinte. Parecem igualmente úteis tanto o termo latino quanto o grego. Os gregos expressaram os dois conceitos com uma única palavra; os latinos, ao invés, usaram ‘quotidiano’. Se o pão é quotidiano, por que o recebem com o tempo de um ano, como costumam fazer os gregos, no Oriente? Recebe a cada ano aquilo que é necessário a cada dia! Vive de modo digno de recebê-lo cada dia! Quem não é digno de recebê-lo cada dia também não é digno de recebê-lo uma vez por ano. Assim, o santo Jó oferecia diariamente um sacrifício pelos seus filhos (Jó 1, 5), com receio que pudessem ter cometido alguma culpa no coração ou com palavras. Tu ouves repetir que, cada vez que se oferece, anuncia-se a morte do Senhor e a remissão dos pecados e, todavia, não recebes cada dia esse pão da vida? Quem tem uma ferida, busca o remédio. A nossa ferida é sermos sujeitos ao pecado; o remédio, o celeste e venerável sacramento. O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Se recebes o pão cada dia, cada dia é para ti hoje. Se Cristo está ao teu dispor hoje, todos os dias ele ressuscita para ti. Como se dá isso? ‘Tu és meu filho, eu hoje te gerei’ (Sl 2, 7). Hoje, isto é: quando Cristo ressuscita”

Santo Ambrósio, De sacramentis, 5, 24-26 (PL 16, 452-453)