Dom José Falcão de Barros reflete sobre a frase “Seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu”, da oração do Pai Nosso, a partir de um texto de Santo Agostinho:

“O pão cotidiano pode significar aqui diversas coisas: 1) Todas as coisas necessárias para o sustento da vida presente. A esse respeito, foi declarado: ‘Não vos preocupeis com o dia de amanhã’ (Mt 6, 11). Essa recomendação explica ter sido acrescentado o ‘dá-nos hoje’. 2) Ou então significa o sacramento do corpo de Cristo que recebemos todos os dias. 3) E ainda, a refeição espiritual da qual o mesmo Senhor disse: ‘Trabalhai não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que perdura até a vida eterna’ (Jo 6, 27). ‘Eu sou o pão descido do céu’ (Jo 6, 41). Entretanto, é bom examinarmos, entre esses três sentidos, qual o mais provável. Poderá alguém se admirar de que precisemos pedir a Deus para conseguirmos as coisas necessárias para esta vida no corpo, como, por exemplo, o alimento e a roupa, havendo dito o Senhor: ‘Não andeis preocupados, dizendo: Que iremos comer? Ou que iremos beber? Ou que iremos vestir’ (Mt 6, 31 – Lc 12, 22). Ora, poderá alguém ficar sem preocupação diante dessas coisas que deseja obter e que deve pedir a Deus, com toda a atenção? A esse respeito, refere-se o Senhor quando falava do quarto cujas portas deveriam ser fechadas, ao se orar. E ainda estas palavras: ‘Buscai, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas’ (Mt 6, 33 – Lc 12, 31). Evidentemente, o Senhor não diz: buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e depois buscai essas coisas, mas sim: ‘e todas essas coisas vos serão acrescentadas’, isto é, sem que preciseis procurá-las. Contudo, eu não vejo como se possa dizer, na verdade, que quem pede a Deus com empenho não procure aquilo que deseja obter.

Santo Agostinho, De sermone Domini in monte, 2, 7, 25-27 (PL 34, 1279-1281)