Dom José Falcão de Barros reflete sobre a frase “Seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu”, da oração do Pai Nosso, a partir de um texto de Tertuliano:
“Pedimos que ‘seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu’ não no sentido de que alguém possa opor-se a que se faça a vontade de Deus e Lhe desejemos êxito no cumprimento de Sua vontade; ao invés, pedimos que esta se faça em todas as coisas. ‘Ceu’ e ‘terra’ pode interpretar-se de modo figurado ‘carne’ e ‘espírito’. Porém, mesmo que entendido literalmente, o sentido desse pedido não muda: que a vontade de Deus se cumpra em nós sobre a terra, a fim de que possa também cumprir-se em nós no céu. Mas que outra coisa Deus quer de nós, senão que caminhemos segundo os seus preceitos? Pedimos, portanto, que nos conceda o alimento e a riqueza da sua vontade, para que sejamos salvos no céu e na terra, pois a síntese de sua vontade é a salvação de todos os que Ele adotou como seus filhos. Esta e a vontade de Deus, realizada pelo Senhor pregando, agindo, sofrendo. Pois se Ele mesmo afirmou não fazer sua vontade, mas a do Pai, fez, sem dúvida, a vontade do Pai, a cujo modelo nos estimula, para que a cumpramos pregando, agindo e sofrendo até a morte, para o que necessitamos do auxílio de Deus. Assim mesmo, suplicando ‘faça-se a tua vontade’, desejamos um bem a nós mesmos, pois não pode haver mal algum na vontade de Deus, mesmo quando se deve sofrer alguma adversidade por causa dos méritos. Com isso, preparamo-nos para o sofrimento, pois também o Senhor quis manifestar a debilidade da carne em sua carne, na iminência de sua paixão: ‘Pai’, disse, ‘afasta de mim este cálice’; e, depois de refletir, acrescentou: ‘Porém, não se faça a minha vontade, mas a tua’”.
Tertuliano, De oratione, 4 (PL 1, 1157-1158)