Dom José Falcão de Barros reflete sobre a frase “Seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu”, da oração do Pai Nosso, a partir de um texto de São João Crisóstomo:
“Notai a mais cabal ilação nas palavras do Senhor. Mandou-nos que desejemos os bens que virão e que aceleremos o passo em nossa viagem para o céu; mas, enquanto a viagem não termina, mesmo vivendo na terra, quer que nos esforcemos por levar a vida do céu. ‘É preciso – diz-nos – que desejeis o céu e os bens do céu; com efeito, antes de chegar ao céu, eu vos mando que façais da terra céu, e que, mesmo ainda vivendo na terra, fazei e dizei tudo como se já estivésseis no céu’. Viver na terra não é obstáculo algum para que possamos alcançar a perfeição dos poderes do céu. É possível, mesmo permanecendo aqui, fazer tudo como se já estivéssemos ali. O que diz, portanto, o Senhor é isto: ‘Da mesma forma como no céu tudo se faz, sem obstáculos, e não acontece que os anjos obedeçam em alguns casos e desobedeçam em outros, mas que em tudo obedeçam prontamente – porque são poderosos em força, diz o salmista, e cumprem sua ordem, assim nos concede a nós os homens não cumprir em parte tua vontade, mas cumpri-la toda, como tu queres’. Considerai como Jesus Cristo nos ensina a ser humildes, ao fazer-nos ver que nossa virtude não depende só de nosso trabalho, mas da graça de Deus. Ele ordena aqui, a cada fiel que reza, que o faça universalmente, isto é, por toda a terra. Pois não diz ‘seja feita a vossa vontade’ em mim ou em vós, mas ‘em toda a terra’, a fim de que dela seja banido o erro, nela reine a verdade, o vício seja destruído, a virtude floresça novamente, e que a terra não mais seja diferente do céu”.
São João Crisóstomo, Homiliae in Matthaeum, 19, 5 (PG 57, 279-280)