Dom José Falcão de Barros explica o Catecismo da Igreja Católica. Reflete passagens bíblicas, a frase “Venha a nós o Vosso Reino”, da oração do Pai Nosso, e um texto de São Gregório de Nissa: “O pedido sucessivo reza para que venha o Reino. Mas pode talvez aspirar a reinar aquele que não cessa de ser Aquele que é (Ex 3, 14), inacessível a qualquer mudança, que não pode encontrar um ser superior a Si no qual devesse se transformar? Que sentido tem um pedido que invoca o Reino de Deus? Para conhecer a verdade profunda disso, importaria que o Espírito de verdade nos revelasse os seus ocultos mistérios. Eis qual é a nossa interpretação dessas palavras. O poder de Deus, que se situa no princípio de todas as coisas, é a liberdade verdadeira e onipotente; o universo é o seu império, ela não impõe o seu reino nem com a força, nem com a tirania, não dita a sua lei aos seus súditos com o temor ou com a coerção. A virtude deve, portanto, ser livre de todo temor, independente, deve escolher o bem por espontânea vontade. A fonte de todo bem consiste em submeter-se ao poder que dá a vida. Quando o homem, com a traição, cessou de desejar o bem, a nossa vontade seguiu a direção oposta, o mal invadiu a vida dos homens por toda parte e a morte encontrou mil caminhos para introduzir-se em nós, porque todo vício é um caminho aberto para a morte. Um tirano nos assedia, como um exército de carrascos e de inimigos, e tornamo-nos escravos da morte e das paixões. É, portanto, justo rezar para que venha o Reino de Deus em nós. Com efeito, não existe nenhum outro modo de escapar da tirania diabólica e da morte senão submetendo-se ao poder que dá a vida. Queira Deus que eu, libertado das cadeias do pecado, fuja da corrupção e da morte; que a morte não mais me domine, que a tirania do vício não mais me escravize e que o inimigo jamais me aprisione, fazendo de mim escravo do pecado! Ao contrário, venha o teu Reino, afastem-se e sejam aniquiladas as paixões que me dominam e me oprimem. Elas se dissipem como se dissolve a fumaça; como a cera funde no fogo, também elas desaparecerão. […] O mesmo acontece como reino de Deus em nós: ele faz desaparecer todas as forças que nos aprisionam. As trevas não resistem à luz, a doença desaparece quando volta a saúde, retiram-se as paixões diante da impassibilidade divina, foge a morte, dissipa-se a corrupção, quando reinam em nós a vida e a incorruptibilidade! Venha o teu reino! Doce é a palavra que essa súplica dirige a Deus: rechaça o exército dos adversários, aniquila a falange dos inimigos, põe fim à guerra da carne contra o espírito! O corpo não serve mais de cidadela ao inimigo da alma. Manifestem-se o teu poder real, a mão dos anjos, as cortes que nos guiam, as miríades que estão à nossa direita, para fazer caírem milhares de adversários. O inimigo é forte, mas é temido e invencível somente pelo homem privado do teu socorro, e enquanto ele combate sozinho. Todavia, tão logo afirma-se o teu reino, dissipam-se a dor, a tristeza e os prantos para dar lugar à vida, à paz e à alegria. Venha o teu Espírito Santo” (São Gregório de Nissa, De oratione dominica, III (PG 44, 1155-1158)